quarta-feira, 23 de setembro de 2009

Parece-me que é conhecida e já bastante usada a expressão de que muito do que nós somos passa por o que lemos. Ironias à parte sobre uma possível crise de identidade portuguesa, podemos generalizar dizendo que podemos conhecer melhor um povo atendendo aos objectos bibliográficos que levam na mão (incluindo A Bola). Acho que era mais ou menos isso, e não pura coscuvilhice, que eu tentava fazer quando tentava ver a capa ou conseguia mesmo ler um bocadinho dos livros que alguem lê no metro. Sinceramente, parece-me um indice muito mais fiável do que o top 10 da fnac.
Agora que vivo numa terra nova, retomo velhos hábitos. Aqui, vi repetidamente pessoas a passar com grandes calhamaços de capa preta e umas letras assim um bocado a dar para o gótico. Por momentos pensei que fosse aquela história dos vampiros e senti-me em casa. Mas não, aquilo eram titulos grandes e tinham um desenhinho na capa. Por várias vezes tentei ler mas não dava, o que me fez pensar muito no agravamento da minha condição de míope. O livro aparecia vezes sem conta na mão dos estranhos que passavam por mim. Começou a ser uma verdadeira praga. Às vezes só o via de lado e já sabia que era ele. Senti-me tomada pela curiosidade mas principalmente pela ignorância. Quem és tu! Porque é que eu nunca ouvi falar de ti! Até que decidi tomar o caminho mais fácil ao entrar na livraria da minha faculdade. Lá estavam eles todos pretinhos, grossinhos e empilhadinhos em lugar de destaque. E então, tal e qual como uma grávida de trigémeos recebe uma surpresa eu vi que eram três livros diferentes! E que por acaso eu ate ja tinha vendido um deles (mas um portuguesinho) quando trabalhava numa livraria. Foi então que descobri que a praga dos livros pretos aqui em Barcelona se deve a um sueco, Stieg Larsson, e que esta, tal como todas as pragas que vêm de Espanha, já deve ter chegado a Lisboa.

sábado, 12 de setembro de 2009

Non, je ne regrette rien

Desde há algum tempo para cá tenho vindo a reflectir muito sobre a questão do arrependimento. Como se lida com ele, ou melhor, quais os sinais que me permitem reconhecê-lo, não nos outros, já que não tenho muito jeito para tarefas inglórias, mas nos sentimentos que me assolam .
Diria, de um modo simplista que o arrependimento é o desejo de mudar o passado. Nunca me aconteceu tal coisa. Até porque sou uma pessoa extremamente nostálgica e mesmo os mais terriveis acontecimentos entram no bau das recordações luminosas.
Acontece-me, porém, muitas vezes, desejar mudar o presente. Não querer estar aqui mas ali, não querer fazer isto mas aquilo. Acontecia-me muitas vezes e de repente, sem aviso prévio, como um ataque súbito de mal-estar. A partir de certa altura apercebi-me da frequência e inevitabilidade destes, e esse desejo tornou-se totalmente prevísivel. Uma consciência adjacente a qualquer decisão que tomo. Quando quero já sei que depois não vou querer. Porquê fazê-lo então? Porque não há maneira de matar um desejo sem que surja outro. E um desejo vivo faz comichão.